Portal de Eventos CoPICT - UFSCar, [UFSCar Araras] XXV CIC e X CIDTI - 2018

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Os custos da reprodução não são maiores para indivíduos femininos do que masculinos de uma espécie arbórea tropical
Rafaela Letícia Brito Bispo, Priscilla de Paula Loiola, Valéria Forni Martins

Última alteração: 2018-10-08

Resumo


Em espécies dióicas, a reprodução é normalmente mais custosa para indivíduos femininos. Como consequência, plantas femininas podem florescer em menores frequência e intensidade, apresentar maior mortalidade, crescer menos e tornar-se reprodutivas somente quando têm reservas energéticas suficientes, ou seja, com tamanho maior do que o dos indivíduos masculinos. Esses fatores podem levar a uma razão sexual deslocada a favor dos indivíduos masculinos. Além disso, os indivíduos femininos podem apresentar localização restrita a manchas ambientais mais favoráveis, resultando em segregação espacial dos sexos (SES). Porém, podem existir mecanismos de compensação aos maiores custos reprodutivos dos indivíduos femininos. Neste estudo, testamos seos custos da reprodução são maiores para indivíduos femininos do que masculinos de duas populações de uma espécie arbórea dióica abundante e amplamente distribuída na Mata Atlântica. Todos os adultos de Mollinedia schottiana (Spreng.) Perkins (Monimiaceae) localizados dentro de duas parcelas permanentes de 1 ha cada instaladas na Floresta Ombrófila Densa de Terras Baixas, Ubatuba-SP, tiveram seu diâmetro na altura do solo (DAS) e localização espacial medidos em 2007-2008. Na mesma época, também foram realizadas observações fenológicas mensais. Os mesmos indivíduos foram remedidos em 2016-2017. Para verificarmos se a frequência de floração foi menor para indivíduos femininos do que masculinos, determinamos visualmente se havia mais picos de indivíduos masculinos em floração do que de femininos ao longo de 12 meses. Para verificarmos se a floração foi menos intensa para indivíduos femininos do que masculinos, utilizamos o maior valor observado de intensidade (índice de Fournier) da floração de cada indivíduo em uma ANOVA dois fatores (sexo e parcela). Para verificarmos se indivíduos femininos morreram em maior proporção do que masculinos e se as populações tinham menor proporção de indivíduos femininos do que masculinos, fizemos testes de qui-quadrado. Para testarmos se indivíduos femininos apresentaram menor crescimento relativo em relação a masculinos entre o primeiro e o segundo censos e se tinham maior DAS, fizemos ANOVAs dois fatores. Para avaliarmos se ocorria SES, inspecionamos visualmente mapas para verificar se indivíduos femininos ocorriam isolados dos masculinos. Não encontramos diferença na frequência e na intensidade de floração, na proporção de mortos, no crescimento relativo e no DAS entre indivíduos femininos e masculinos. Também não observamos SES. Porém, a razão sexual foi de 1F:1,9M nos dois censos populacionais e nas duas parcelas. Assim, não há evidências de maiores custos reprodutivos para indivíduos femininos nas duas populações estudadas, provavelmente porque eles apresentam mecanismos de compensação a esses custos. Esses mecanismos incluem maior eficiência no uso de recursos, maiores taxas de assimilação de carbono e alocação mais efetiva de recursos, bem como associação de indivíduos femininos a fungos micorrízicos. Outros fatores, como produção de mais sementes masculinas do que femininas e mudança de sexo durante o desenvolvimento, devem explicar a razão sexual deslocada a favor dos indivíduos masculinos. Estudos futuros devem abranger fisiologia, genética e variações ambientais para o melhor entendimento dos custos da dioicia.

 


Palavras-chave


Alocação de recursos; dioicia; Mata Atlântica; Mollinedia schottiana; segregação espacial dos sexos; trade-off

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