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Trabalhadores digitais: entre a autonomia e o controle
João Pedro Ferreira Perin, Aline Suelen Pires

Última alteração: 2021-02-25

Resumo


As mudanças estruturais e organizacionais na economia capitalista a partir de meados dos anos 1970 romperam com o padrão de acumulação então vigente, baseado no binômio fordismo/keynesianismo. Este período, marcado por uma reestruturação produtiva caracterizada pela flexibilização da produção, veio acompanhado por processos drásticos de transformação tecnológica e informacional. O trabalho tornou-se mais variado e algumas atividades adquiriram formas imateriais que passaram a exigir a criatividade, tendo em vista uma maior demanda subjetiva e de mobilização da inteligência. É diante deste cenário que nossa questão de pesquisa foi se desenhando, em particular, perante as formas de gestão organizacional após a reestruturação produtiva, praticada pelas empresas especificamente do ramo de desenvolvimento de software. Em torno do tema da autonomia dos trabalhadores digitais – tidos como trabalhadores exemplares típicos do trabalho imaterial – e suas percepções acerca das configurações do trabalho advindas de um novo paradigma tecnológico e flexível, buscamos analisar se e de que maneira a autonomia é vivenciada e percebida pelos trabalhadores informacionais que atuam na fábrica de software Cronos (nome fictício), localizada na cidade de São Carlos-SP, além de se discutir as possíveis formas de controle sobre suas atividades. O estudo de caso como método qualitativo utilizado nessa pesquisa, propiciou uma maior profundidade no campo escolhido, sendo uma ferramenta eficiente diante da proposta de apreender percepções dos trabalhadores e mecanismos particulares oriundos da empresa em questão. Buscamos, ao máximo, abordar trabalhadores digitais com funções diversificadas na empresa. Foram realizadas 8 entrevistas de trabalhadores, com funções e perfis diferentes, a partir de um roteiro semiestruturado. Para além das entrevistas, foi possível realizar uma visita à empresa, que proporcionou uma visualização mais clara, tanto do ambiente de trabalho, como dos trabalhadores reunidos e realizando suas atividades cotidianas de maneira espontânea. Pudemos observar que os trabalhadores digitais da empresa Cronos de fato tendem a obter uma margem de autonomia frente à sua atividade, sobretudo se a comparação é com atividades mais mecânicas e/ou padronizadas. Constituem-se em meio a um contexto flexível e intelectual por excelência, resultando em um maior controle do próprio trabalhador sobre sua atividade de elaboração do produto. Sendo assim, esse trabalhador exibe características subjetivas tais como criatividade, habilidades comunicativas e autonomia. Entretanto, esta autonomia, por vezes, se manifesta de forma limitada. A presença de etapas que compreendem enrijecimento, padronização, prestação de contas, remanescentes de práticas tayloristas/fordistas contrariam a autonomia prometida ao trabalhador e institucionalizada pela empresa. O intermédio da forma organizativa de produção e sua particularidade, outorgada pela fábrica Cronos através do modo outsourcing de produção, acaba por instituir elementos que, exemplificados pelo fenômeno constante de intervenção do cliente na produção, representam importantes limitadores da criatividade e autonomia na atividade de produção do software. A autonomia no trabalho informacional deve ser relativizada, tanto para a questão de controle absoluto, tanto para uma concepção de um trabalhador dotado de independência, autonomia e subjetividade emancipada.