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EGRESSOS DO SISTEMA PRISIONAL: A RECONSTRUÇÃO DA CIDADANIA POLÍTICA APÓS O CERCEAMENTO DA LIBERDADE
Gabriel Avila Casalecchi, Guilherme Alessandro Lemos da Silva Moreira

Última alteração: 2021-03-18

Resumo


Estudos no campo da socialização política frequentemente convergem para a tese de que talsocialização ocorreria massivamente durante a fase pré-adulta (infância e adolescência). Porconsequência, tais estudos acabam por atribuir, primeiramente, grande relevância para o papelsocializador desempenhado por estes ambientes específicos e, em segundo lugar, adotam comopressuposto que os indivíduos quando adultos dificilmente acabam por alterar suas crenças e atitudesem relação à política, sendo, assim, pouco elucidativos quanto aos processos de mudança, alteração eruptura da socialização política influenciados pela própria trajetória de vida dos indivíduos. Nessesentido, o referido estudo procura evidenciar o papel do sistema prisional na socialização política, umavez que tal instituição realiza um cerceamento da liberdade e uma perda da possibilidade departicipação política através do voto. Além disso, destaca-se o fato de que o encarceramento podeconstituir-se enquanto um processo traumático na trajetória de vida dos indivíduos, fomentandoconsequências que extrapolam a vida no cárcere e que influenciam diretamente os processos deressocialização política e social dos egressos prisionais, uma vez que significa a interrupção quase quetotal das dimensões pedagógicas, psicológicas, socializadoras e integradoras relacionas ao processode participação política (LAVALLE, 2011). Com base neste contexto, buscou-se apreender 1) apercepção e a confiança em relação ao Estado e seus aparelhos; 2) a percepção e a adesão àdemocracia enquanto regime político; 3) a percepção e a avaliação que faziam de si enquanto sujeitosque atuam no mundo político através do voto ou de outras formas de participação. Para alcançar taisobjetivos foi realizado o levantamento de dados primários por meio de entrevistas semiestruturadas portelefone com três egressos prisionais, tendo como base a técnica de “história de vida” e “análise detrajetórias” (GOLDENBERG, 1999), dando enfoque às percepções dos sujeitos sobre suas própriastrajetórias, sobretudo a temas referentes a participação e concepções políticas, sem perder de vistaelementos pré e pós-cárcere. Desta forma, por meio das entrevistas foi possível constatar em primeirolugar, uma desconfiança em relação ao Congresso Nacional, Governo Federal, Judiciário e partidospolíticos, expressa sobretudo pela existência de “corrupção” nestas instituições. Em segundo lugar, osegressos prisionais exteriorizaram a importância de elementos fundamentais da democracia como, porexemplo, o direito ao voto, a liberdade de imprensa e a liberdade de expressão (DAHL, 2001; 2015),mas ao mesmo tempo realizaram sugestões para que determinadas instituições democráticas fossemremovidos e/ou substituídas como, por exemplo, a substituição do Judiciário e do Congresso Nacional
pelas Forças Armadas. Em terceiro lugar, constatou-se um grande apreço pela participação políticaprioritariamente via voto, ainda que se utilizassem também de outras formas tradicionais ou não departicipação. Portanto, acreditamos que o referido estudo atingiu os seus objetivos, bem como tenhacontribuído para o debate nacional acerca do sistema prisional e da trajetória de vida de egressosprisionais, fornecendo para tanto uma perspectiva da Ciência Política e, desta forma, suprindo umalacuna nas abordagens feitas ao tema que partam de tal instrumental teórico (LOURENÇO; ALVAREZ,2018).

Referências


DAHL, Robert A. Sobre a democracia. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2001.DAHL, Robert A. Poliarquia: participação e oposição. 1 ed. 3 reimp. São Paulo: Editora daUniversidade de São Paulo, 2015.GOLDENBERG, M. A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em Ciências Sociais. Riode Janeiro: Record, 1999.LOURENÇO, L. C.; ALVAREZ, M. C. Estudos sobre prisão: um balanço do estado da arte nasciências sociais nos últimos vinte anos no Brasil (1997-2017). Revista Brasileira de InformaçãoBibliográfica em Ciências Sociais / Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em CiênciasSociais, São Paulo, abril 2018.