Portal de Eventos CoPICT - UFSCar, XXVII CIC e XII CIDTI

Tamanho da fonte: 
Uma análise discursiva dos guias e das cartilhas do participante do ENEM: o(s) discurso(s) sobre escrita dirigidos aos participantes
Letícia de Santana Tizioto, Luiz Andre Neves de Brito

Última alteração: 2021-02-25

Resumo


Este trabalho traz resultados finais da Iniciação Científica realizada de agosto de 2019 a outubro de 2020 com o propósito de investigar os discursos sobre escrita que circulam nos guias e cartilhas do participante do ENEM, centrando-se, mais precisamente,  no modo como o Inep (Instituto Nacional de Estudo e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) constrói uma imagem de si e da escrita ao se endereçar ao candidato. Para esta comunicação, trazemos a análise dos textos de apresentação dos guias e das cartilhas para mostrarmos o estatuto que o enunciador (Inep) confere a si e ao seu destinatário (candidato) para legitimar o dizer institucional. Os dados analisados são, portanto, extraídos dos 05 (cinco) textos de apresentação do material selecionado - os guias do participante (2012 e 2013) e as cartilhas do participante (2016, 2017 e 2018) produzidos pelo Inep com a finalidade de tornar mais transparente o sistema de avaliação da redação no Enem. A metodologia partiu de uma análise exploratória observando previamente uma parte menor do corpus, prosseguindo para a tabulação e criação de categorias para, por fim, darmos enfoque à análise, especificamente dos tópicos “texto de apresentação” e “comentários”. Para conduzir esta análise, mobilizamos o quadro teórico-metodológico da Análise do Discurso de linha francesa, mais precisamente, as noções de formações imaginárias (Pêcheux) e de ethos discursivo (Maingueneau) associadas à questão da heterogeneidade enunciativa (Authier-Revuz) que faz explodir a transparência da linguagem e a unidade do sujeito. Os dados integrais observados mostram que o Inep utiliza-se de recursos linguísticos nos textos de apresentação presentes na cartilha, a fim de criar um efeito de aproximação com o leitor (participante). Essas evidências podem ser notadas, por exemplo, no uso de verbos em 1a pessoa do plural, nos usos do pronome de tratamento “você” e do pronomes possessivos (“seu” e “sua”) que são índices mostrados marcados da projeção do interlocutor. Ainda, nos comentários notamos a acuidade nas escolhas lexicais, no uso de termos como “excelente”, “consistente”, “diversificado”, “produtivo” evidenciando um processo em curso, que se volta para fora do texto: o destinatário dos guias e das cartilhas é projetado na preocupação com a atribuição de adjetivos qualificadores, no detalhamento da  estrutura composicional do gênero dissertativo, bem como a clareza das explicações sobre o conteúdo temático e o modo de explicar cada critério avaliativo.

Por fim, instigados pelas perguntas “Quem sou eu para lhe falar assim” e “Quem é ele para que eu lhe fale assim”, notamos o efeito de responsabilidade provocado pelo Inep de responder pelas suas palavras quando o material ganha circulação social, configurando a noção de “fiador”. Ademais, a construção da imagem desse destinador, privilegiando a dimensão de “tom”, construído no âmbito da representação subjetiva-, caracteriza um ethos dito. Tal ethos  explícito e visível evidencia que o Inep mostra diretamente suas características enquanto instituição que deseja o ingresso dos participantes em universidades federais, projetando uma imagem de justiça, preocupação e complacência.



Palavras-chave


Análise do Discurso. Ethos. Enem. Guias e Cartilhas do Participante.

Referências


AUTHIER-REVUZ, J. Heterogeneidade(s) enunciativa(s). In: Caderno de Estudos Lingüísticos. Campinas, 1990.

BATISTA, Adriana Danielski. A leitura da palavra e a palavra da leitura: plasticidade e sentido. 2015. Tese (Doutorado em Letras) Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2015.

FERNANDES, Claudemar. Análise do Discurso reflexões introdutórias. 2ª ed. SP: Claraluz, 2007.

FIGARO, Roseli. Comunicação e Análise do Discurso. SP: Contexto, 2013.

FOUCAULT, M. [1969]. A arqueologia do saber. 6. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 1995.

______. [1969]. A Análise do Discurso: Três épocas (1983). In: GADET, F.; HAK, T. Por uma análise automática do discurso: uma introdução à obra de Michel Pêcheux. Campinas: EDUNICAMP, 1990. p. 311-318.

MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos e comunicação. 4ª ed. SP: Cortez, 2005.

MAINGUENEAU, Dominique. A propósito do ethos. In: MOTTA, Ana. Raquel; SALGADO, Luciana. (Org.). Ethos discursivo. São Paulo: Contexto, 2008.

MARCUSCHI, Luiz. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. Rio de Janeiro. Lucerna, 2002.

MOTTA, A. R.; SALGADO, L. Ethos discursivo. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2011.